segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Tabu

Havia uma porta aberta na casa-celeste de Ursa e imergiam através dela meses de agosto intermináveis, incontáveis, intransigentes, tempestuosos mas ao mesmo tempo misticamente ingênuos. Eram só meses de agosto...!
esse ano Ursa escancarou a porta por que viu que era só crescer e perceber que agostos podem acontecer a qualquer porta. Não só nas de 31 dias.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Perifeérico - diário de bordo - anotação 01

Tudo começou quando eu assisti ao espetáculo "III" (de uma companhia sem nome mas convencionalmente chamada de Atores independentes) no ano passado no Festival brasileiro de teatro. Nunca mais tinha assistido algo que tivesse me tocado tanto no sentido do tesão à vontade de fazer. A poética, a estética e o trabalho denso dos atores no espetáculo me chamaram muito a atenção. Fiquei realmente encantado com o trabalho e foi a primeira vez que vi o Rafael na vida.
Depois foi o "6 meses aqui" que me fez mais uma vez ficar estupefato com o trabalho num sentido geral, e assumindo um teatro que eu particularmente gosto muito: sem muita dependência cênica quanto ao espaço, iluminação, etc, e onde o jogo das atrizes era o que dizia o que era e o que não era. Fiquei muito emocionado. O baque foi tamanho que eu acabei caindo doente no dia seguinte, acometido por uma febre delirante causada por uma inflamação das amigdalas e da faringe. Mas esses dois espetáculos foram fundamentais pro que eu quero começar a fazer hoje. Agora. Nascer e morre a cada segundo.
Não lembro como conheci o Rafael...mas aí ele acabou entrando no processo de um curta que a gente tá trabalhando até hoje, do mesmo jeito capenga e apaixonado que a gente faz teatro. "uma câmera na mão e uma idéia na cabeça". Em certo momento do trabalho ele me convidou pra fazer parte de um processo com um texto autoral chamado "Perifeérico" que ele já estava montando. Eu fiquei com um pé atrás, por estar planejando começar um processo com o Lucas e com a Ana, mas como nada é certo nesse mundo, aceitei. Ele me entregou o texto, mas só fui lê-lo de fato um pouco antes de nós realizarmos nosso primeiro encontro, mais por falta de tempo e preguiça que por desinteresse. O texto é incrível, e o personagem caiu como uma luva. (deixo claro que isso pode ser uma faca de dois gumes pra/o mim/ator)
A montagem vai ter como base o pra construção o trabalho com as máscaras, o clown, e também referência na comédia Del'arte. Estaremos ensaiando no prédio do SIT (Sistema Integrado de Teatros) ás Segundas, Quartas e Sextas-feiras pra adiantarmos o processo.

Nos encontramos pela primeira vez nessa segunda-feira(09/08) na Etdufpa, conversamos um pouco, e só estávamos esperando o Renato Torres (que escreveu o poema "Perifeéricos" o qual Rafael se baseou pra começar a escrever [e que coincidentemente foi musicado pelo meu pai]) chegar pra irmos pro SIT, pra conversar e começar a definir a questão da musical. Uma questão foi jogada pelo Rafael: ele quer um espetáculo onde haja música acústica, que dê tom ao espetáculo mas que não se pareça com um musical. Vamos ver como isso vai ser resolvido. O Renato não vai poder nos acompanhar agora no início, iremos trabalhar com indicações dele, que serão acompanhadas pela Gabi que tem um tato mais técnico pra música. A primeira indicação que ele nos passou foi ouvir tudo (Como estou ouvindo agora esse teclado, esse mouse e esse cachorro do vizinho latindo).
Nós também começamos a ler o texto, a Krishna já tinha uma cena pronta por já estar no processo, na opinião do diretor a cena perdeu um pouco, e pra mim faltou um vigor com relação ao corpo. Está faltando um ator que viajou e que volta na próxima semana. Espero que ele consiga nos acompanhar quando chegar. Bendito seja o dia em que um processo não tenha problemas com falta de ator!

Enfim
É um prazer muito grande estar entrando nesse processo com uma paixão intacta, e dizer que tenho certeza que eu quero agora pra minha vida, ainda mais estar voltando pro lado de gente que começou comigo na escola, como a Krishna, Kaká Carvalho (Karllana Carvalho hahah) e o Maurício que vai nos orientar na questão do figurino. Ainda tem as novas parcerias como o Rafael e a Gabi. Na verdade esse processo vai ser uma redescoberta, e uma descoberta de vidas que agora se encontram e voltam a se encontrar pelo teatro.

Agora é trabalho! ir atrás do corpo, da voz, da cuca, enfim do meu confuso e apaixonado "Dermont" que se parece tanto comigo que estou seriamente precisando me anular pra poder começar a inalá-lo.

sábado, 8 de agosto de 2009

Cena para um saco plástico

Tinha um gato no peito que miava e rasgava minha camisa. Um gato pilantra cujo maior divertimento era arranhar tudo, das cortinas aos sapatos, tudo em pedaços; eu gosto às vezes de pensar que era mentira, afinal, a essência dessa história é naturalmente mentirosa, quem acreditaria que gatos podem viver dentro de humanos? Pensar que é mentira faz com que eu me sinta num leve prazer, e reivindique a asma para justificar meus chiados felinos. A asma é uma doença que conta a trajetória do ar, ele entra grande nos pulmões e sai pequenininho, então existe a sensação de que não existe respiração, de que a morte é um sopro. A asma sem dúvida é a história do vento que entra tufão e sai brisa, e eu não sabia que as análises de cunho médico poderiam ser tão bonitas.

Mas se tratamos de gatos, vamos falar de gatos e não de bobagens. Quando eu falo de algo eu falo.

Falo desmedidamente.

A asma, entretanto, não pode ser descartada, porque também tem uma ligação intensa com a natureza dos gatos; eu, por exemplo, sofria de repentinas crises de asma ao entrar em contato com os sete gatos da minha prima. Todos os sete bichos traziam em si as sete etapas do sufocamento: o primeiro acendia uma coceira incômoda no nariz, o segundo era responsável pelas crises de espirro, o terceiro deixava meus olhos inflamados, o quarto começava a atiçar o afogamento interno, vedava minha garganta, hermeticamente. O quinto por sua vez tocava na parede dos pulmões, o sexto incendiava os brônquios, o sétimo e último era o alvo de toda a minha ira.


(...)

Os meninos da minha infância eram maus, colocavam gatos em sacos e jogavam-nos no meio da rua ou em algum rio; o que eu lembro é do grito terrível dos gatos aprisionados; lembro-me do som agudo de um desespero até então desconhecido pelos que vivem na infância.

O fim do gato que miava e rasgava minha camisa foi, da mesma forma, embalado por uma mágica expressividade sonora, ensurdecedora de todos os ouvidos. Já faz tanto tempo que nem me lembro do nome do bichano, nem de sua raça, nem de sua cor, era um desses que não se sabe bem o feitio, um desses que causam dúvida até nos mais comovidos veterinários. Mas esta merda é um gato ou uma porta? Ou um capacho? Ou um dilúvio?

Não sei, só sei que rasgou minha camisa.

O gato que miava e rasgava minha camisa está morto.

Foi que certa vez, no meu peito, tinha um rio e uma rua.



Texto de Paloma Amorim

(Esse texto ela me entregou no mesmo momento em que o Cléo chegou aqui em casa)


sábado, 1 de agosto de 2009

Corprocesso - rascunho

Quando eu fui procurar por aulas de corpo, sabia mais ou menos onde eu estava metendo meu nariz; e precisava, já era hora de de fato trabalhar o corpo, não ignorá-lo nem trabalhá-lo cegamente nos processos que estão vindo. Antes eu acreditava em "conhecer", mas conhecer a gente conhece desde que nasce, conhece no toque, na sensibilidade sexual de todo o tato. Eu realmente fui com o interesse de trabalhar o corpo pra cena, mexer com ele, marcá-lo pra sempre. Consegui. Estou indo, né? Os exercícios começaram por processo coreográfico (Não fui pra "aulas de corpo" como exercício de experimentação especificamente, mas uma oficina de dança ministrada pelo Danilo Bracchi - mas que depois foi se transformando naquilo que eu de fato queria)
Fiz a aula e fui convidado pra voltar e pra participar do novo processo de montagem da então nascente Cia de Investigação Cênica. Foi o ponto de partida pra começar a trabalhar -ainda instintivamente - o corpo na cena já com direcionamentos quanto à objetivos cênicos e dramatúrgicos. É muito difícil trabalhar com a linguagem corporal quando são colocados esses objetivos cênicos, por que pra quem ainda não domina essa linguagem, exprimir algo a partir dela é tão difícil quanto respirar. O processo está em andamento, na verdade preciso me concentrar mais nas minhas impressões...de vez em quando parece que eu não sei exprimir tudo.


O corpo é o grampo retorcido que vai abrir a porta pro resultado.